Alguns cancelamentos de shows frustraram fãs brasileiros recentemente. A cantora americana Norah Jones desistiu da apresentação que faria em dezembro por conta da morte do pai, o compositor e citarista indiano Ravi Shankar. A banda britânica Coldplay suspendeu sua turnê na América Latina em novembro, três dias depois de anunciá-la. E a cantora americana Fiona Apple abandonou a ideia de vir ao país por conta da doença de seu cachorro.
Paralelamente, os shows dos ícones pop Lady Gaga e Madonna venderam ingressos abaixo do esperado. Para alguns analistas, foram sinais de desaceleração de um mercado que vinha registrando boom desde 2010, outros afirmam, que foram casos pontuais e que o setor continuará crescendo fortemente.
Todos os shows cancelados recentemente contavam com seguro, com exceção da apresentação de Norah Jones, cuja produtora, a XYZ Live, teve de arcar com os prejuízos. Procurada, a produtora informou que não teria, por ora, um porta-voz disponível para comentar o assunto.
Pacotes costumam cobrir custos de apresentações não realizadas por questões climáticas ou morte de parentes
Já o show da Fiona Apple tinha seguro, mas a apólice não cobria uma eventual doença de seu animal de estimação. Por isso, o seguro da Allianz não pôde ser acionado e o prejuízo ficou com a produtora Time For Fun que, procurada pela reportagem, não quis se pronunciar.
Para se proteger de eventuais prejuízos causados por cancelamentos, as produtoras que trazem as atrações internacionais ao país contratam um pacote que, entre outras modalidades, inclui seguro de responsabilidade civil e o chamado "no show", que cobre os investimentos feitos antes do cancelamento, como gastos com marketing e locação do espaço, e receitas não realizadas, como a devolução do ingresso aos clientes.
A cobertura, no entanto, só ocorre quando o cancelamento é causado por questões climáticas, por morte ou doença do artista, de seus parentes ou cônjuge. A venda dos ingressos abaixo do esperado fica de fora do seguro, pois é considerada risco do próprio negócio, mas já há seguradoras estudando novos tipos de cobertura.
A Superintendência de Seguros Privados (Susep) não tem dados consolidados do setor. Contudo, somente a Allianz, que responde por 90% desse mercado, movimentou R$ 500 milhões em seguros para shows em 2012. A empresa não dá previsões para este ano, mas a concorrente Berkley estima que o segmento seguirá crescendo a taxas de 40%, mesmo ritmo de 2012.
"O Brasil se tornou alvo dos grandes produtores de eventos internacionais, que estão demandando mais, promovendo eventos internacionais aqui. Isso deve continuar", disse Regiane Camargo, gerente de responsabilidade civil da Berkley, cuja carteira de seguro de eventos, que inclui de shows a casamentos, deve fechar em R$ 3 milhões em 2012.
Os empresários dos artistas internacionais mais famosos normalmente exigem a contratação do seguro por parte da produtora para a realização do show no país. Como os grandes shows ficam com as grandes produtoras, são elas os principais clientes dessas apólices, diz Dulce Thompson, líder da prática de seguros de esportes e entretenimento da Marsh Brasil. "Hoje em dia um grande patrocinador não vai colocar o nome dele junto a empresas que não têm essas garantias."
Segundo a executiva, trata-se de uma carteira rentável para as seguradoras no Brasil. "As condições climáticas nos favorecem", afirma. Conforme calcula Dulce, enquanto no país a sinistralidade está em torno de 40%, no exterior chega a 80%.
Para Juliana Santos, responsável pela carteira de entretenimento da Chubb, os cancelamentos de shows acendem uma luz amarela para as produtoras de pequeno e médio portes, que ainda não costumam se valer do seguro. A executiva espera que o aumento dos sinistros signifique mais contratações no futuro e um consequente aumento das receitas.
"Ainda existem muitos produtores de eventos com orçamentos médios, que não têm seguro. Se acontece algum imprevisto, aquela produtora quebra. Nossa preocupação hoje é com as centenas de pequenas e médias produtoras", diz Juliana. A Chubb fecha uma média de 300 apólices por mês, e encerrou 2012 com cerca de 3,2 mil apólices de eventos, entre shows, congressos e feiras.
Bruno Amorim, diretor comercial corporate da corretora Aon Risk Solutions, considera que o mercado brasileiro de seguros para shows ainda é imaturo. "Se percebe que alguns shows de produtoras pequenas muitas vezes não cumprem a exigência contratual do artista", disse.
Conforme explica, cada artista tem um risco específico, analisado caso a caso. "O histórico do artista conta bastante. Analisamos idade, condição de saúde dele e dos parentes cobertos", diz, acrescentando que problemas com drogas não são cobertos pelos seguros.
O executivo lembrou o caso da turnê "This is It", de Michael Jackson, cujo seguro de R$ 35,5 milhões do Lloyd's of London, não foi acionado pela produtora AEG, já que a seguradora alegou que os problemas de dependência de medicamentos do rei do pop tinham sido ocultados. "Drogas e alcoolismo não entram. Qualquer ato ilícito é alvo de exclusão do seguro", diz Amorim.